A Polícia Federal afirmou em relatório da Operação Venire que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tinha “plena ciência” da fraude em sua carteira de vacinação.
Em despacho no qual autorizou a ação, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), escreveu considerar “plausível, lógica e robusta” a hipótese de que o ex-chefe do Executivo, “de maneira velada”, procurou “eventuais vantagens advindas da imunização, especialmente considerado o fato de não ter conseguido a reeleição”.
Alinhada a interesses de Bolsonaro durante seu governo, a subprocuradora-geral Lindôra Araújo refutou a linha investigativa. Para ela, o ex-ajudante de ordens Mauro Cid “teria arquitetado e capitaneado a ação criminosa, à revelia, sem o conhecimento e sem a anuência” do ex-presidente. Bolsonaro negou ter tomado vacina ou alterado seu cadastro. “Fico surpreso com a busca e apreensão na casa do ex-presidente para criar um fato”, disse ele.
De acordo com relatório da PF, há provas de que Bolsonaro sabia da inserção fraudulenta dos dados de vacinação.
A fraude, segundo a corporação, pode “ter sido realizada com o objetivo de gerar vantagem indevida para o ex-presidente relacionada a fatos e situações que necessitem de comprovante de vacina contra a covid-19”. Bolsonaro e aliados sempre rejeitaram os imunizantes.
Burla
Para os investigadores, os documentos teriam servido para burlar restrições sanitárias impostas por Brasil e Estados Unidos. No esquema, operado de Duque de Caxias, município fluminense governado por um aliado do ex-presidente, foram beneficiados sua filha Laura, de 12 anos, o tenente-coronel Cid, suas filhas, além dos assessores Max Guilherme e Sergio Cordeiro.
Segundo a PF, no dia 21 de dezembro, foram lançados no sistema do Ministério da Saúde registros de duas supostas doses em nome de Bolsonaro. As aplicações datam de agosto e outubro de 2022. Seis dias após o lançamento, os dados foram excluídos. Já o certificado de Laura foi emitido em inglês pelo aplicativo ConecteSUS no dia 27 de dezembro. No fim do ano, a família embarcou para os Estados Unidos.
Com base no relatório, Moraes afirmou ser “imprescindível” a realização das buscas e apreensões, além das prisões. A Procuradoria-Geral da República (PGR), em manifestação de Lindôra, deu parecer parcialmente favorável à ofensiva – não defendeu, por exemplo, que o endereço de Bolsonaro fosse vasculhado.
Para Moraes, relator do inquérito das milícias digitais, não seria “crível” o argumento de Lindôra de que Cid agiu sozinho no esquema. O ministrou afirmou que as provas colhidas “apontam um comportamento coordenado”.
Passaporte
Nesta quarta, 3, Bolsonaro teve seu celular apreendido. Moraes determinou ainda o recolhimento de seu passaporte e de suas armas – o Estadão apurou que esses itens não foram encontrados.
Na frente de sua casa, em Brasília, Bolsonaro disse que o celular levado não tem senha porque não há nada a esconder. “Nunca me foi pedido cartão de vacina, não existe adulteração da minha parte”, disse. “Não tomei vacina porque li a bula da Pfizer, só isso e mais nada.”
À PF, Bolsonaro afirmou que não prestaria depoimento, que estava previsto para ontem. A decisão foi tomada em reunião com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto.
Em comunicado, o dirigente partidário disse que o aliado “é uma pessoa correta, íntegra, que melhorou o País e procurava sempre seguir a lei”. Segundo o assessor do ex-presidente, Fábio Wajngarten, só haverá oitiva após acesso ao processo. “Bolsonaro estará à disposição, como sempre esteve, das autoridades competentes.”
Em comunicado, os advogados Paulo Amador da Cunha Bueno, Daniel Bettanio Tesser e Wajngarten afirmaram que o ex-presidente “nunca recebeu qualquer imunizante contra covid”. “Na constância de seu mandato, somente ingressou em países estrangeiros que aceitassem tal condição ou se dessem por satisfeitos com a realização de teste viral”. Segundo eles, Michelle Bolsonaro se vacinou, mas Laura, não, em razão de “comorbidades”.
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